Pouco importa saber se houve antecipadamente o propósito de criar uma
música “mineral” para a gravação de “Basalto”, ou se tal aconteceu
acidentalmente, como de resto é próprio da improvisação. O certo é que,
com a junção de Ernesto Rodrigues, para mais recorrendo a um violino
barítono, de Abdul Moimême, com as esculturas de chapa com que prepara
a guitarra eléctrica, e da percussão ribombante do francês Antez,
estavam reunidas as condições para que a música resultante do encontro
fosse cavernosa e tivesse ressonâncias de pedra. As novas correntes da
música improvisada mais ou menos alinhadas com os conceitos
reducionistas não têm por hábito (é até considerado proibitivo por
alguns) sugerir estados de espírito ou emoções particulares, mas está
aqui uma notável excepção: este é um disco escuro, inquietante, por
vezes, inclusive, sinistro. Chega a lembrar as actuações que Lustmord
fazia há uns anos em grutas profundas, ainda que descontando o factor
do estilo industrial e tendo presente que este CD é predominantemente
acústico, enquanto Lustmord é um nome da electrónica “dark”.
Os dois longos temas compilados fazem-nos viajar por um pesadelo sem
sobressaltos, suave e inebriante. Mas é uma curiosa viagem: não
seguimos em diante, descemos. Para cada vez mais perto do coração da
Terra, até perdermos a consciência de onde estamos. A esse processo
dificilmente poderemos chamar “iluminação”, tal como os místicos de
várias religiões fariam, devido às conotações negras muito próximas,
mas também não se trata de escapismo ou de alienação. Fiquemo-nos pela
explicação de que é uma forma – especialmente brilhante – de entender
por dentro o que é uma rocha ígnea eruptiva e de composição máfica.
Rui Eduardo Paes for Jazz.pt
Aptly called "Basalto", the black rocks resulting from lava, the music
is hard, organic, ungiving, harsh and structured around a tonal center
without much variation except for the timbral shifts grinding like
tectonic plates under severe pressure, yet without any hope to get
release from the relentless tension. Ernesto Rodrigues plays octave
viola and baritone viola, Abdul Moimême is on electric guitar and Antez
plays percussion, although it is hard to identify what sounds come from
which instrument on the two long tracks. The music creates a sonic
universe that is broad and deep, giving something fundamental and
strange, like the status of our planet even before life came to be,
when only rocks and water and air and fire were fighting slowly and
majestically and unavoidably for their own space.
Rodrigues has become a real advocate for his kind of music, creating
exceptional listening experiences to open-eared audiences, working to
give other musicians the chance to release like-minded electroacoustic
and avant-garde music on his Creative Sources label.
Stef for Free Jazz Collective.